O que a polêmica envolvendo Sheherazade diz sobre direita e esquerda?


Nada me deixa mais intrigada do que ver brasileiros se intitulando “de esquerda” ou “de direita”. Quando ouço essa frase prefiro acreditar que se trata de habilidades futebolísticas, pois em um Brasil possuidor de uma política tão precária e corrupta - assim representada em todos os partidos políticos - só consigo deduzir que há muitos pseudo-intelectuais andando por aí.

O caso da âncora do jornal SBT Brasil, Rachel Sheherazade, é um excelente demonstrativo do quão ignorante ainda é boa parcela da nossa população. Ao opinar sobre o caso do jovem, com ficha criminal, amarrado nu a um poste como retaliação por seus crimes, a jornalista estava expressando um palpite pessoal, questionável sim, todavia incapaz de representar ideologias políticas.

Quem ainda defende essas duas classificações como se cada atitude representasse um lado político, precisa estudar um pouco mais a história política brasileira e a real validade de ambos os termos “esquerda/direita”. Com a consciência, por exemplo, de que não há uma oposição ativa no país e os filiados de partidos engolem suas ideologias na primeira oportunidade de benefícios próprios ou coletivos.

Cientes disso, defender a ideia de o comentário da âncora ter sido de direita, apenas rotula e segrega, embora em nada acrescente ao debate. Aqui enfatizo duas das frases ditas pela jornalista: “... a atitude dos vingadores é até compreensível” e “... aos defensores dos direitos humanos que se apiedaram do marginalzinho preso ao poste, eu lanço uma campanha: Faça um favor ao Brasil: adote um bandido!”.

Na primeira frase é nítido que Rachel apresenta todo um cenário ineficaz para que haja esse tipo de atitude, em nenhum momento concordando com o ato, apenas justificando-o. No fim do comentário, porém, a âncora cai no senso comum de que todo bandido é bandido porque quer e deve ser tratado o mais cruelmente possível. Pena uma profissional desse nível ainda acreditar que um ato criminoso fundamente uma penalidade perversa.

Estando Rachel certa ou errada, o fato é que os brasileiros ainda não estão preparados para um jornalismo escancaradamente  opinativo. Telespectadores de todas as classes sociais estão moldados em um padrão de jornalismo, em que o objetivo é informar sem se intrometer, por isso a reação tão contrária à opinião da âncora do horário nobre.

Essa é também a razão para que demais emissoras sempre tenham cuidado excessivo em comentar notícias, pois a audiência é instável. Arnaldo Jabor também cometeu sua gafe no ano passado ao criticar avidamente as manifestações de junho. Dar o poder de opinião à voz de um único profissional é, além de dispensar a ele uma grande responsabilidade, um ato que pode torná-lo prepotente.

Muitos dos comentários de Rachel têm sido elogiados e até aclamados, mas nesse caso não surtiu o mesmo efeito. Não foi diferente com Jabor e Bóris Casoy. A única desarmonia é que dessa vez a voz é feminina. Portanto espera-se que, assim como os demais citados, ela também receba absolvição pela infelicidade de expressar uma opinião não só politicamente quanto humanamente incorreta.

Afora isso, torçamos por um futuro com jornalismo de qualidade sustentado por avaliações concretas e relevantes para a sociedade, baseadas em estudos humanísticos, filosóficos, sociológicos e estatísticos em detrimento de comentários que apenas auxiliam o modelo educacional retrógrado que temos nesse nosso Brasil varonil.

Comentários

  1. Impressionante a sugestão de estudar um pouco mais... a coisa é bem simples: quanto mais conservador, mais de direita; quanto menos conservador, mais de esquerda. todas nossas ações representam, sim, um lado político, não importando o tamanho da ignorância da pessoa à respeito da política. a política, atualmente, pode ser entendido como a "arte" de governar; mas em sentido mais profundo, a política se dá em toda relação humana em uma sociedade (em maior ou menor grau, dependendo da esfera onde aocntece). o despreparo da sociedade com relação a um jornalismo opinativo se dá pela falta de senso crítico da mesma, levando-a a engolir qualquer besteira (ou não) apresentada em algum meio de comunicação em massa. a principal diferença do Jabor pra sheherazade é que ele fala mais "pomposamente", o que o faz parecer inteligente. não que ele não seja, mas também fala besteira aos montes.

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    1. Mas e aquelas pessoas Sandman que possuem algumas convicções de esquerda e outras de direita? Serão chamadas como? Acredito que essa divisão serve apenas para distanciar a população de trabalhar em conjunto para melhorar a situação do coletivo. Enquanto cada um procura um lado que lhe caiba melhor (e observe nenhuma das ideologias prevê a melhoria coletiva, embora ambas prometam) deixa de se atentar que é o "todo", independentemente de opiniões, que realmente importa.
      Quanto a falta de senso crítico, concordo plenamente. E sim, Jabor também fala besteira pq opinião pessoal ás vezes é besta mesmo. Mas no caso do jornalismo opinativo as opiniões precisam ser mais embasadas em fatos e dados do que apenas na vivência pessoal.

      Obrigada pelo comentário, afinal, toda opinião só tem a acrescentar ao debate ;)

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  2. Na verdade, estão crucificando a Rachel por uma opinião (escancarada mesmo, e assim deveria ser) DELA. Realmente não vem ao caso se ela está correta ou não, afinal, é bem difícil estarmos sempre corretos. Mas TODOS têm um lado (não digo político) mas cada um escolhe um lado da história para acreditar e/ou defender. Eu realmente não consigo ver nada de errado nos comentários da Rachel e nem por isso devo me considerar de "direita", até pq este rótulo é RIDÍCULO, não há coisa mais brega. E acho mesmo que os brasileiros não estão preparados para este tipo de comentários explícitos. Uma pena. Como cobrar liberdade de expressão e/ou liberdade de imprensa se uma jornalista é crucificada por dar sua opinião? Confuso, não? Desse jeito os jornais já podem ser extintos.

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    1. Pois é Rafaela, talvez isso ocorra porque poucas pessoas são convictas de suas opiniões e por essa razão se incomodam ao extremo com opiniões divergentes, sejam ou não de jornalistas. Ainda acredito que tenha mesmo a ver com educação e compreensão do que é democracia.

      Obrigada pelo comentário, pois todo parecer acrescenta ao debate ;)

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    2. Bem isso Andreza. Pois, só a título de comparação, o comentário da Rachel sobre o carnaval gerou uma polêmica enorme, mas não vi ninguém a crucificando. E agora, todo esse "auê" por este comentário dos "justiceiros". Realmente é difícil de entender o povo.

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