Caso "João de Deus" revela um lado obscuro da cultura brasileira
Foto: TV Brasil
|
As denúncias
de abuso sexual contra o médium espírita, popularmente conhecido como “João de
Deus”, embora chocantes, demonstram resquícios de uma cultura patriarcal e machista
em que, durante séculos, homens poderosos dominaram e submeteram mulheres a situações
humilhantes para satisfazer seus próprios interesses. João Teixeira de Faria
ainda teve a seu favor o disfarce religioso, outra suscetibilidade brasileira.
Um plano perfeito para que pudesse satisfazer sua perversidade sexual em um contexto
no qual homens sempre tiveram aval para exercer domínio violento sobre as mulheres.
Os casos
demoraram a vir à tona porque as vítimas acreditavam que cada ocorrência era um
fato isolado, tornando o cenário de punição algo bastante utópico. E João
estava ciente disso, afinal, mesmo com uma ou outra denúncia feita, o
médium era aclamado pelos moradores de Abadiânia (GO) por ter transformado a
cidade em um ponto turístico extremamente rentável. Cientes de que no Brasil dinheiro
remete poder, não é difícil calcular que políticos, policiais e empresários podem
ter sido agraciados ou ameaçados nessa longa jornada criminal.
Infelizmente
esse cenário prova que além da ineficácia dos poderes públicos, a mulher está
em uma posição ainda mais vulnerável quando comparada ao homem. Afinal, quem
acreditaria que um senhor de 76 anos, reconhecido internacionalmente, religioso
e poderoso teria abusado sexualmente de uma fiel? Foi necessário que uma
holandesa – cidadã de uma cultura bem menos opressora – decidisse dar o
primeiro passo, para que as outras vítimas sentissem ter o direito de trazer à
tona suas próprias experiências com o médium.
Fato é que
muitos desses 330 abusos poderiam ter sido evitados caso as primeiras mulheres
violentadas tivessem sentido que seriam ouvidas e protegidas. Mas ao contrário,
sua consciência lhes dizia que se optassem por denunciar o crime, elas mesmas seriam
as maiores prejudicadas. Sim, é um cenário surreal, em que ao sofrer um dano
dessa magnitude, a vítima não recorra à Justiça por haver uma possibilidade
muito grande de sofrer represálias e ainda ter de assistir ao criminoso levar
uma vida normal e continuar a cometer os mesmos atos.
O contexto
histórico mostra que casos de abuso sexual provocados por homens aparentemente insuspeitos (pais, familiares, autoridades) são comuns especialmente nas regiões mais precárias do país, em que a mulher
tende a ser mais dependente devido ao baixo nível de escolaridade, tradições
e à precariedade financeira. Além disso, fatores como poder, certeza da
impunidade, troca de favores entre autoridades e homens abastados, são pilares
para que relações de estupro ocorram e sejam encobertas diariamente, permitindo que Joãos tenham espaço para suas ações cruéis.
Na verdade, mesmo
nas regiões mais desenvolvidas, com maiores níveis de conhecimento e
informação, os abusos de poder e sexuais, e assédios acontecem com certa
frequência. Afinal, quantas vezes você já foi elogiada maliciosamente por um
chefe ou colega de trabalho? Quantas vezes já ouviu comentários ofensivos em
uma rodinha masculina? Ou será que você também não sofreu alguma relação íntima
forçada?
Talvez você
seja uma mulher sortuda e nunca tenha tido que provar sua capacidade
intelectual e profissional perante a um novo membro da equipe que, ao te ver,
estava certo de que você chegou naquele nível de sua carreira devido à sua
aparência ou “favores”, para, no final ainda ouvir o clássico “elogio”: “Nossa,
pelo visto você não é só um corpinho bonito”. Homens e mulheres precisam encarar que o
assédio sexual pode ser apenas um primeiro passo para que o criminoso
incremente suas fantasias e prolongue o constrangimento da vítima como forma de
tornar toda a situação mais prazerosa para si próprio.
Homens,
proteger as mulheres contra investidas inoportunas não é feminismo, é questão
humanitária. A vítima pode ser a âncora do noticiário, uma desconhecida, mas também
pode ser sua filha, sua mãe, sua esposa ou sua colega de trabalho. Incentivar
denúncias, manter o diálogo aberto, notar pequenas mudanças de comportamento
nos indivíduos ao seu redor e não fazer apologia a esse tipo de crime e suas variantes, são passos importantes para tornar o mundo mais justo e seguro. E, de quebra, propiciar um país que culturalmente respeite a existência feminina.
Vão usar até quando as situações (que ocorrem em vários setores da sociedade) para aproveitar e falar mal da religião? muito democrática!
ResponderExcluirA religião é peça fundamental na sociedade brasileira SIM! E sempre será. A começar por continuar a cuidar de hospitais, escolas, lares para idosos, de reerguer cidades como Manaus que foi devastada, campanhas de meio-ambiente, campanhas em prol da família e muito mais. DIZER é fácil, agora quero ver FAZER! A igreja AGE! Não apenas CRÍTICA!
Querido (a), por favor, releia o texto e selecione o trecho em que falei mal de religião e me envie para que eu possa analisar o seu questionamento. Obrigada. Volte sempre!
Excluir