Seis meses e algumas cicatrizes depois
Seis
meses após desembarcar na Holanda, já faço uma ideia de como será difícil me
despedir desse país, ainda que isso signifique voltar para casa. Com apenas mais
meio ano pela frente residindo na terra dos moinhos, os planos ainda não concretizados
parecem demais frente ao curto período de tempo que está por vir.
Em
seis meses, ainda não conheci todas as cidades que gostaria, não visitei todos
os países que pretendia, não experimentei todas as comidas típicas que deveria,
mas já não me considero mais aquela mesma pessoa que vi na última olhada no espelho
antes de pegar o avião.
Além
das mudanças externas, alguns quilos a mais, mãos com cicatrizes de queimaduras
devido a água quente das torneiras, unhas em estado deplorável, pele ressecada,
há uma quantidade enorme de ideais que também já não são mais os mesmos.
Descobri
que ao longo dos meus 25 anos, eu nunca soube exatamente quem eu era. Sei que é
um clichê, mas quando dizem que passar uma temporada absorvendo outra cultura é
uma jornada de autoconhecimento, acredite, não estão exagerando.
As
fraquezas ficaram bastante evidentes nesse período. A ansiedade com a qual tive
que lidar a vida toda, aqui, atingiu seu ápice. A minha dificuldade em
interpretar mapas nunca foi tão óbvia, embora agora eu esteja melhorando nesse quesito. Mas como descrever todos os pontos fortes que descobri a meu
respeito?
Em
todos esses meses, as frustrações foram muitas e, parte delas, comigo mesma.
Criei expectativas sobre tantas situações que não ocorreram como
esperado, mas também foram extasiantes as experiências que vivi sem cálculo prévio.
Vivências
que vão desde pegar o caminho errado e se achar em um lugar mais incrível do
que o destino previsto, aprender palavras em idiomas pelos quais não se tinha
interesse prévio, até conhecer pessoas espetaculares e suas histórias
peculiares e inspiradoras.
E,
aqui, conhecer gente se tornou meu passatempo favorito. Desvendar o mundo
contado por outras pessoas é hilariante. Visões, expressões, emoções que
afloram de rostos até então desconhecidos, de diferentes culturas, peles,
histórias, destinos. Nessa tentativa de se autodescobrir, os “estranhos” são
uma grande influência sobre quem nos tornamos.
Distante
das referências de uma vida inteira e tendo um novo idioma como forma de
comunicação, fiz inúmeras amizades duradouras. Companheiros que sempre poderei
contar quando revisitar alguns países. Amigos que fizeram parte dessa experiência,
com quem dividi momentos bizarros de bons. Pessoas que me deram suporte em uma
fase em que nem eu estava muito segura de mim mesma.
Cada
reencontro, inclusive com amigos que havia conhecido no Brasil, sempre foi
motivo pra respirar aliviada por me deparar com minha essência. Além, é claro,
das grandes amizades reforçadas pela distância. É na separação que se descobre
a constância de uma relação.
Ainda
não conclui o meu objetivo por aqui, mas já posso constatar que valeu a pena.
Todas as descobertas, frustrações, aprendizados, invenções e mudanças foram
capazes de me fazer entender quem sou hoje e quem quero ser no futuro. A partir
de agora, não importa onde eu esteja ou com quem, a felicidade de me reinventar
andará sempre comigo.
A saudade de quem parte é a mesma de quem fica. Nos deixamos nos lugares que descobrimos e somos convidados pela vida a nos deixar seguir seu curso e suas "paradas". Essa vontade de abraçar o mundo é representada justamente pelo abraço de quem parte, quem retorna e de quem aceita a incrível experiência de viver a realidade de um sonho.
ResponderExcluirAgradecida pela poesia de suas palavras que poderiam certamente complementar o sentimento do texto. Obrigada e concordo plenamente ;)
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