Ajude seus avôs a lerem a bula



Visitar os avôs é como estar no presente e dar uma volta no passado. No seu, no da sua família. É descobrir que seus pais faziam muito daquilo que te impedem de fazer hoje e que, sim, eles também são frágeis. Seus avôs são capazes de falar por horas de parentes que você nunca viu na vida. São eles que vão contar como foi a sensação de ouvir um rádio pela primeira vez ou de como era ruim a vida sem energia elétrica.

Em algum momento da visita, você vai notar que eles reclamam muito sim, mas têm motivos para isso. Afinal, as dores são muitas e as saudades... Ah, essas nem se fala. São eles que vão trocar seu nome pelo de algum outro neto ou pelo de um filho, e você nem vai se chatear, porque saberá que é sempre por excesso de amor.

São eles que vão te incentivar a estudar e trabalhar. Mas mesmo sem dizer, eles te farão entender, que apesar da independência ser muito boa na juventude, todos precisam de um amor de verdade ou pelos menos de uma companhia, porque a velhice é uma etapa para ser dividida, afinal, “não é fácil não”.

É com seus avôs que você descobre que o calor aumenta muito nessa fase da vida e que o fogo quase desaparece. Que realmente a saúde é o bem mais precioso que um ser humano pode ter. E você descobre que, por mais óbvio que seja, você vai mesmo ficar velho um dia. E não vai demorar tanto quanto seu cérebro faz parecer.  E que quando chegar lá vai ansiar para que seus netos dêem um tempinho em suas tarefas interessantes e resolvam lhe fazer uma visita, nem que seja por meia horinha.

Conversar com seus avôs é tentar convencê-los da razão de ainda estar solteira (o). É tentar explicar (todas as vezes) no que você vai trabalhar nessa profissão que escolheu. É contar que já está no último ano da faculdade e confessar que não sabe o que fará depois e mesmo assim ouvir: “vai dar tudo certo, fia: você ainda vai ganhar muito dinheiro. (E casar-se bem, é claro)”.

Com esses velhinhos, você sempre vai conversar sobre assuntos que não falaria com mais ninguém. Vai confessar seus erros, enquanto eles preferem mencionar seus acertos. São seus avôs que confiam nas suas escolhas, mesmo daquelas das quais até seus pais discordam.

Quando eles tiverem entediados, peça-lhes que lhe contem como se conheceram ou conte a eles seus planos mirabolantes. Discorde das “crendices” deles e apresente argumentos comprovados pela ciência, pois isso vai deixá-los agitados e um pouco estarrecidos, mas não se preocupe: algumas coisas eles precisam saber antes de partir.

E antes que isso aconteça, aproveite-os do modo mais honesto e desinteressado possível. Debata as angústias das gerações. Converse sobre Deus. Faça os rir e ria com eles, ou deles. Chore, console. Ajude-os nos dias em que a enfermidade assolar. Confie neles e em seus conselhos. E use sinônimos. Sim, sinônimos, pois esses velhinhos “sabe-tudo” odeiam palavras difíceis na mesma intensidade que detestam nomes de remédios e letra de médico. Ah! E ajude-os a lerem as bulas.

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