Vivendo a vida alheia

                                                                         Foto: Andreza Galiego

Milhares de pessoas por aí almejam a vida dos famosos. Uns por causa do dinheiro, outros pelas mordomias, outros pela fama ou pela beleza. E a maioria por tudo isso junto. Confesso que não consigo compreender profundamente a razão disso. Não vou ser hipócrita a ponto de dizer que nunca me imaginei como celebridade. Mas quando isso ocorreu foi por motivos talvez mais modestos, como por exemplo, a possibilidade de chamar a atenção para assuntos importantes.

Essa busca incessante por reconhecimento é intrínseca ao ser humano. Trabalhamos, somos bons em algo e queremos que os outros saibam disso. O problema nasce quando a fama se torna mais importante do que o trabalho realizado. A grande maioria que deseja a fama, não faz nada prático para conquistá-la, apenas cuidam e recuidam da vida de famosos, como se fosse possível se tornar conhecido apenas repetindo os passos alheios. O pior é que essa possibilidade existe. Infelizmente. Embora deva ser profundamente humilhante ser famoso por copiar idéias.

Ao contrário, há muitas celebridades que não querem ser famosas. As chamadas personalidades são as pessoas que fazem um trabalho sério, sem almejar a fama, só que, infelizmente, suas funções têm essa conseqüência. Essas sim são dignas de admiração. Pagam o alto preço de serem constantemente vigiadas, mas ainda assim trabalham direito e com amor. Precisam se submeter às constantes intromissões de um público tão volúvel quanto as ações bancárias. Deixam de sair e até de comer, por causa dos olhos vorazes de seus fãs-inimigos, que hoje amam e amanhã odeiam. Não deve ser nada fácil aguentar esse mundo cruel da fama, que movimenta milhões de dólares em todo o planeta.

Dinheiro que poderia ser investido em causas mais nobres do que fofoca. Claro que todos gostamos de saber um pouquinho sobre a vida alheia, mas desde que isso não afete nossos afazeres ou nos iluda ao ponto de passarmos a viver a vida do outro. Com tantas notícias trágicas que nos são despejadas diariamente, é bom ter um pouquinho de entretenimento, de ilusão. Sim, porque essa vida de glamour é composta muito mais por fantasia que por realidade. As celebridades são seres humanos e padecem dos mesmos problemas e anseios que nós, desconhecidos. A diferença é que eles têm suas vidas estampadas nos jornais e revistas. Algo que me parece complicar muito as coisas.

Imagine que seu marido lhe traia ou você brigue feio com um colega de trabalho e dez minutos depois há dezenas de notícias sobre o assunto em vários locais. E o pior, as informações estão bem distorcidas e você, que nem teve culpa, está como o vilão da história. Pois é. Não parece bacana. Parece invasivo, ofensivo e até cruel. Eu não aguentaria isso nem por um dia. Mas há quem clame por isso. Desculpe-me os que pensam assim, mas acho que pode haver nisso alguma carência não resolvida na infância/adolescência.

Enquanto a vida alheia interessar mais do que a falha na educação, a falta de alimento, a precariedade da saúde, as guerras no mundo, os preconceitos e tantas misérias existentes, o ser humano será medíocre, porque as nossas preferências refletem o que somos. Talvez devêssemos olhar um pouco mais para as injustiças que ocorrem com homens, mulheres e crianças que sobrevivem em um mundo real, sem glamour ou entretenimento. Dessa forma, poderíamos reencontrar a essência humana, a decência e, quem sabe, o reconhecimento por algo bem feito, quiçá mais divino do que humano.

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